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Tragédia anunciada

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A barbárie que se instalou há muito tempo no sistema carcerário nacional é a demonstração clara e cabal de que o estado perdeu totalmente o controle sobre as penitenciárias. É emblemática a repetição dessa verdadeira catástrofe, não apenas em Rondônia, mas também em Pernambuco e Roraima. A situação exige que o estado brasileiro cumpra o dever de fazer com que as prisões voltem a ser destinadas a seu verdadeiro propósito, que é garantir a custódia dos presos e a correta aplicação da pena aos condenados. A obviedade do raciocínio, ao contrário de esvaziá-lo por exaustão, exige uma postura mais incisiva e permanente das autoridades, instituições e também de setores organizados da sociedade na busca de soluções para uma questão que afeta e apequena a consciência de todos. Não é algo que se possa, passado o primeiro momento de espanto e estarrecimento pela exibição de um cenário do mais absoluto terror, ser engavetado na memória, sepultado por tantas e tamanhas outras prioridades que avassalam o país.

Definitivamente não! A situação detonou apenas uma parcela mínima da verdadeira hecatombe alimentada dia a dia por um sistema caótico, pronta para explodir, devastadora, por todas as unidades prisionais do país, espargindo culpa por cada cidadão que acredita ser esse um problema “dos outros” ou exclusivamente do governo. É uma catástrofe anunciada e o alheamento não inocenta ninguém. A OAB não se omite também nessa questão de importância crucial. Em comunicado à imprensa, o presidente nacional da Ordem, Cláudio Lamachia observa que “as recentes imagens que mostram a existência de um verdadeiro show de horrores dentro de prisões de Pernambuco, Roraima e Rondônia são novos capítulos de uma história muito antiga e conhecida. Cabe ao Estado brasileiro cumprir a obrigação de resolver esse problema com a rapidez e a urgência necessárias.

O Poder Público precisa, segundo ele, reassumir o controle das penitenciárias e dos presídios, hoje controlados por facções criminosas. Do contrário, toda a sociedade continuará vulnerável às conseqüências da não aplicação correta da lei, que exige das autoridades públicas o combate ao crime e a aplicação das penas segundo critérios legais, não de barbárie. Do jeito que estão, as prisões servem como escolas do crime, com graduação e pós-graduação nas mais diferentes práticas criminosas, violentas e repulsivas. Cabe ao Estado fazer com que as prisões voltem a ser destinadas a seu verdadeiro propósito, que é garantir a custódia dos presos e a correta aplicação da pena aos condenados.

A população penitenciária brasileira chegou a 622.202 pessoas em dezembro de 2014. O perfil socioeconômico dos detentos mostra que 55% têm entre 18 e 29 anos, 61,6% são negros e 75,08% têm até o ensino fundamental completo. Os números estão no último relatório do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), relativo a dezembro de 2014, divulgado em abril deste ano. Segundo o estudo, o Brasil conta com a quarta maior população penitenciária do mundo, atrás apenas de Estados Unidos (2.217.000), China (1.657.812) e Rússia (644.237). Entre os detentos brasileiros, 40% são provisórios, ou seja, não tiveram condenação em primeiro grau de jurisdição.

Tais números não indicam, porém, redução da insegurança da população. Existem pelo menos 500 mil mandatos de prisão não cumpridos em todo o país. De cada cem crimes pelo país, mais de 90 nunca foram descobertos. E, ainda assim, apenas de 5% a 8% dos assassinos são punidos. É preciso, portanto, desafogar o sistema, hoje abarrotado por presos provisórios, praticantes de pequenos furtos e portadores de pequena quantidade de drogas. É preciso estabelecer critérios para melhor selecionar essa faixa da população carcerária – geralmente as vítimas preferenciais da barbárie – e impedir seu convívio com bandidos de maior periculosidade – geralmente protagonistas da violência nos presídios e no comando das facções. É preciso ainda, como ressaltou Cláudio Lamachia, atuar para que a ressocialização dos detentos, após o cumprimento da pena, seja bem-sucedida: “Esses são os fundamentos do sistema prisional, que estão estabelecidos em lei e precisam ser recuperados rapidamente pelo Poder Público, sob pena de perpetuar uma situação que coloca em risco toda a sociedade”.